Histórias de eventualidades, improbabilidades, bicharadas, noitadas e coisas do arco da velha que de alguma forma me acabam sempre por acontecer. Crónicas diárias com a matilha, muita bicharada à mistura, muita música e sempre com um humor caústico como muita gente gosta de o caracterizar.

16/12/2007

A cobra


No fim de semana foi data de exposalão. E lá estive com as cobras a mão a tirar preconceitos da cabeça das pessoas. Isto é das que não fugiam e se estatelavam contra os transeuntes incautos. Até pessoal de cadeira de rodas fugia de mim e das minhas cobras ... Mas se queremos ser surpreendidos pela humanidade é ter uma cobra na mão. Obtemos as reacções mais diferentes. Desde os gritinhos histéricos, até aos "ai que linda", as reações são as mais diversas. Mas de vez em quando aparece alguém que nos surpreende, ou porque esperávamos que aceitasse bem a cobra ou que pelo contrário foge de nós como o diabo da cruz.
Ontem na exposalão, lá estava com um magote de pessoas à minha volta, quando de entre a multidão vejo dois olhos a brilhar, aproximo-se quando reparo num rapaz mais alto que eu com sérias dificuldades em movimentar-se e ainda mais a falar. Mas o sorriso e o brilho dos olhos era evidente. Olhava para a cobra como quem via um pequeno tesouro, perguntei-lhe se lhe queria pegar e ele a muito custo sussurrou que sim. Vinha acompanhado pelo pai que o apoiava e ajudava a movimentar-se e, imagino, que também pela madrasta, uma senhora brasileira que ia tirando fotografias.
A descoordenação das suas mãos tornava um pouco difícil a acompanhar os movimentos
lentos da cobra mas com a ajuda do pai lá ia conseguindo. Ele continuava completamente maravilhado com a cobra, quando o pai lhe disse "Filho, quando ficares bom, vais ter também uma cobra assim", se já estava comovido, pior fiquei, a minha garganta enrolou-se, deu um nó e os olhos incharam. O pai perguntou-me de onde era originária, eu abri a boca e saiu silêncio, tossi, ajeitei a garganta e lá lhes expliquei que vinham da América do norte. Continuamos na conversa por bem mais dez minutos, em que o pai juntamente com o filho me iam contando as suas peripécias com cobras encontradas no campo e que o filho adorava estes pequenos animais.
Entretanto mais pessoas se iam juntando à nossa volta, e a conversa já se tornava difícil com tantas pessoas a fazerem perguntas e a quererem tocar na cobra, assim eles agradeceram e seguiram o caminho, já iam quase no final do stand quando me lembrei da pequena crimson que lá tinha e que ele ia gostar de a conhecer, gritei de longe se queria ver uma pequena cria. Os olhos dele voltaram-se a encher de luz e o pai disse que sim que gostariam muito. Tirei a pequena do terrário que se enrolou numa espiral na mão em berço dele. Mais umas perguntas e respostas depois o pai agradeceu muito a oportunidade elogiou a nossa iniciativa. Agradeci e desejei umas boas festas e vi-os partir.
Fiquei a pensar, nos bichos "peçonhentos, nojentos e viscosos" que tinha dentro do terrário, e na alegria que tinham dado àquela família e voltei para o meio da multidão com entusiasmo redobrado.

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